24 outubro, 2025

MEIO CAMINHO ANDADO

 «Os nossos negócios são assim», disse Glanz. «O Böhlaug é um rico de coração pequeno. Veja como são as coisas, senhor Dan, as pessoas não têm mau coração, têm-no é pequeno, é um coração onde além da mulher e do filho não cabe mais nada.» Joseph Roth, Hotel Savoy


É caso para lembrar aquela divertida ideia de que, moralmente, só há dois tipos de pessoas: as más e as muito más, sendo as más aquelas que habitualmente consideramos boas. E que são, felizmente, a maioria. Aliás, a língua portuguesa tem uma expressão feliz, «Até nem é má pessoa», a qual indica quem não tem força suficiente para ser bom nem fraqueza em demasia para ser mau. Como o peão que fica parado a meio da rua, tão longe do passeio donde partiu como do que deseja alcançar. Não ser má pessoa é assim uma maneira simpática e indulgente de ser boa pessoa. O comentário de Glanz vai noutra direcção, mas só aparentemente. É verdade que apresenta um padrão quantitativo que justifica a dificuldade de sermos melhores com a pequenez do nosso músculo cardíaco. Fosse maior e seríamos melhores pessoas. Mas que de um modo realista também nos situa no nosso lugar natural, redimindo-nos do egoísmo, da indiferença face ao sofrimento alheio, da ausência de compaixão, apresentando a dificuldade em sermos melhores quase no mesmo plano da impossibilidade de estarmos em dois lugares ao mesmo tempo. E quem dá o que pode a mais não é obrigado.