Jon Fosse deu uma entrevista ao El País, na qual compara a sua escrita a uma composição musical. Como um compositor, destaca o ritmo, as repetições, as variações, formalismos que explicam por que algumas pessoas sintam ao lê-lo o mesmo tipo de dificuldade diante de música que não entendem. Li isto e pensei no meu gato. Tenho uma mesa baixinha preenchida com livros de pintura e fotografia e, vá-se lá saber porquê, foi um livro de Bill Brandt que escolheu para os seus momentos de ociosa meditação. Esse e apenas esse, desprezando todos os outros, apesar dos equivalentes tamanhos e texturas das capas. O que vê ele naquele livro que não veja nos outros? Um cheiro? Uma subtil textura, imperceptível para a minha mão? Por muito que me esforce, não consigo compreender. Uma coisa sei: também ele não percebe o que vejo nele e o que me pode interessar quando o abro. Por muito que olhe para a capa e cheire com rigor felino, nunca saberá o que é um livro de fotografia, nem sequer o que é uma fotografia. O que separa seres humanos uns dos outros pode não ser muito diferente do que separa o ser humano do animal.