14 setembro, 2023

MOLDURAS

Há já algum tempo que passei a dar importância e atenção  às molduras e passe-partouts, sobretudo de quadros vindos de colecções particulares para exposições temporárias. Sei com rigor o momento em que começou: uma exposição de Ferdinand Knopff. O que faz sentido, por ser talvez o pintor, e não, ao contrário do que se possa pensar, Gustave Moreau, que detesto, e a cujo museu nunca fui para não me irritar, que mais me sugere a peculiar figura de Des Esseintes. Em exposições de fotografia não há esse esplendor da moldura, quase sempre frias e funcionais, mas os passe-partouts são da maior importância pelo modo como o seu tamanho joga com o da fotografia, sobretudo enormes passe-partouts com fotografias de escala reduzida, dando-lhe assim, algo paradoxalmente, uma evidência bastante maior. Vi recentemente uma exposição na qual Rui Chafes dialoga com a escultura de Alberto Giacometti. A dada altura, havia uma porta que dava acesso a um túnel bastante comprido e escuro, tudo preto, que depois de longamente atravessado iria dar a uma vitrina iluminada para vermos uma peça de poucos centímetros do artista suíço. Genial, pensei. Pode soar ofensivo para uma obra de arte a importância que se dá ao modo como é vestida pela moldura, passe-partout ou dispositivo cenográfico como o de Rui Chafes, parecendo reduzi-la a uma dimensão mais decorativa no momento em que é pendurada na parede de uma sala ou quarto. Até porque, ontologicamente, a moldura nada tem que ver com o quadro, não havendo nada neste que peça aquela moldura. Ou, se pede, reforça ainda mais o propósito decorativo. Mas, depois, olhamos para o quadro e para a moldura e gostamos do todo como se passassem a fazer parte um do outro. Connosco, seres humanos, passa-se o mesmo. Com a diferença, certamente mais rara na pintura ou fotografia, de não faltarem molduras e passe-partouts cuja importância é esmagadoramente maior e mais vistosa do que a do seu conteúdo.