As pessoas podem estar a barafustar, gritar, esbravejar umas com as outras. Mas se chega a horrenda figura da morte para levar uma delas, as outras remetem-se ao silêncio. Quer dizer: acabou o jogo. Graceja-se com o facto de quando uma pessoa morre serem só elogios. Não vejo problema nisso, caso não se trate de uma figura sinistra e conhecida pela sua relação com o mal. Morreu, desapareceu, partiu, merece pois silêncio ou respeito. Não por acaso que desde a pré-história se dá um tratamento especial a quem deixou o mundo dos vivos. Por isso só talvez o campo da psiquiatria possa explicar o texto de Diogo Ramada Curto, no PÚBLICO de hoje, sobre José Mattoso, com o corpo deste ainda por arrefecer. Muito bem, assume que deseja evitar a "rememoração romântica" de saber quem foi o maior dos historiadores, e tem esse direito. Mas tenha ou não razão em matéria de factos, é absolutamente lamentável o modo acintoso como ridiculariza e achincalha um homem conhecido pela sua modéstia, delicadeza, bonomia, gerador de consensos mesmo entre pessoas tão distantes como Rui Ramos e Rui Tavares, Maria de Fátima Bonifácio e Silvestre Lacerda. A morte torna-nos iguais, e o mesmo deve acontecer na reacção à morte. Irromper no meio do elogio fúnebre com a mesquinha e malcriada cultura das redes sociais, não passa de uma soez aproximação à fronteira da abjecção.