Há anos que esta fotografia me intriga. O que leva Bernard Berenson, um historiador de arte conservador que não apreciava o erotismo e a sexualidade na arte, homem da velha guarda, um puro intelectual, a estar assim tão focado na figura sensual de Pauline Borghèse, ainda para mais uma mulher fútil, pouca dotada intelectualmente, e que coleccionava amantes para além dos dois maridos que teve? Mistério, insisto, que há anos me instiga. Acontece ter comprado um livro sobre David Seymour em cuja capa está esta fotografia, e que ficou a repousar num lugar bastante visível cá de casa, levando-me a olhar para ele com frequência. E foi numa dessas vezes que tive uma iluminação. Bernard Berenson, conservador, para quem, algo platonicamente, a forma ideal é tudo na arte, não consegue resistir, encantado, a esta beleza formal esculpida pelas divinas mãos de Canova, e que não pode deixar de visitar ao passar pela Galleria Borghèse. Mas também desejando intimamente que Pauline não tenha o mesmo destino de Galateia, pelo menos enquanto ali estiver. É esta tensão, esta luta interior do fumador que olha para o cigarro que não quer fumar que, muito provavelmente, estará a dilacerar o espírito de Berenson enquanto contempla seraficamente o corpo de Pauline.