28 abril, 2023

O FUTURO DE UMA ILUSÃO

Lisboa, Basílica de Nossa Senhora dos Mártires, 2023


Passei das aulas sobre filosofia da arte para as aulas sobre filosofia de religião. Há muito que percebo o facto de os alunos se interessarem muito mais pela segunda. Discutir o que faz de um certo objecto uma obra de arte, ou mesmo a obra de arte em si, diz-lhes pouco. Bem mais lhes diz a questão da existência de um Deus com características antropomórficas (um Deus-Pai, bondoso e protector) ou questões de natureza sobrenatural como os milagres ou a existência de uma alma que um dia irá ser levada para uma dimensão celeste, aonde encontrará outras almas familiares que lá chegaram primeiro. Perfeitamente normal. Quase todos eles se dizem católicos, apesar de não saberem o que tal significa (por exemplo, vêem cristianismo e catolicismo como meros sinónimos), enquanto a arte é um país estrangeiro cuja língua desconhecem.

Mas não deixa de ser curioso as crianças começarem pela arte. Adoram desenhar, as cores, as linhas, as formas, trabalhar o barro ou a plasticina, ouvir música, apreciar as imagens em livros. Depois passa e, excepto casos pontuais, abandonam esse território, passando a interessar-se mais por questões religiosas. Ora, significa isso um sinal de maturidade, de superação da infância para chegar a um estado mais adulto? Não, pelo contrário. O interesse pela arte, pelo estudo e análise de obras de arte, é um processo que exige maturidade e conhecimento. Já a crenças religiosa, e o que ela implica, é um modo infantil e regressivo de pensar. Daí que, na sua imaturidade, os alunos se sintam mais próximos dela, e vejam com expectativa uma possível legitimação filosófica da crença, do que ao terem que comparar expressionismo e impressionismo ou emitir opinião sobre o valor da arte conceptual. Ainda assim, teremos que reconhecer a maturidade de uma área como a filosofia da religião, um verdadeiro adulto na sala. Já a religião propriamente dita não passa de um infantário que o adulto se recusa a abandonar, um pouco assim como continuar a dormir com um ursinho de peluche ao longo da vida.