13 março, 2023

CONSERVADORISMO

Lyon, Musée des Beaux Arts, 2023 [painel]

O Prado está a anunciar para Junho uma exposição onde vai pôr Picasso a dialogar com El Greco. Ainda em Madrid, a partir de Setembro, a Casa de Vélasquez apresentará uma exposição que tem como ponto de partida o Verão de 1957, em que Picasso se isola quatro meses, daí resultando 58 versões de Las Meninas. Acaba de encerrar no Musée des Beaux Arts de Lyon uma exposição na qual, durante três meses, puseram Picasso a dialogar com Poussin. Portanto, El Greco, Vélasquez e Poussin. Mesmo estando em 2023, com todo o século XX atrás e quase 1/4 do século XXI, não consigo pensar num pintor com uma efervescência tão moderna como Picasso. Não por causa do cubismo, das Les Demoiselles d'Avignon dos manuais, e tudo isso. Se há coisa que não falta na história da pintura, e ainda bem, são impulsos modernos. Mas no caso de Picasso, olhando para o seu percurso entre o ano em que chega a Paris com 19 anos e a sua morte, é mesmo de efervescência e inquietação interior incessante procura, necessidade de experimentar novas linguagens. É impressionante o modo como o rapazinho de 19 anos, que entrou pela primeira vez no Prado aos 14 anos com os pais, experimenta tanto em tão pouco tempo. Mas foi a pensar no Enterro do Conde de Orgaz, na igreja de S. Tomé, em Toledo, onde estivera há pouco, que representou o enterro do seu grande amigo Carlos Casagemas, que acabara de se suicidar, trágico acontecimento que, segundo o próprio, deu origem ao seu período azul.

No fundo, o que se passa é o seguinte, e aproveito novamente a célebre imagem de S. Bernardo. Picasso, como tantos outros pintores modernos, e só não digo quase todos para não arriscar uma precipitada generalização, enquanto foi anão, precisou dos ombros largos dos seus antepassados gigantes para ver mais longe. Entretanto, o próprio Picasso, como também tantos outros, cresceu, tornou-se ele próprio um gigante, mas sem nunca esquecer o leite do qual bebeu para crescer. Os antigos gigantes foram-se entretanto ofuscando no meio de tanta arte moderna e sobretudo contemporânea, muita dela protagonizada por autênticas Pop Stars que arrastam multidões, que se deixam atrair pela luz como mosquitos e que mesmo quando vão ao Prado, ao Louvre, à National Gallery ou aos Uffizi é mais para se auto-representarem, andando depois por lá sem saberem bem o que fazer como um bebé a quem põem dois talheres nas mãos. Picasso, o grande Picasso, nunca deixou de pensar nos seus antepassados, assumindo sempre, como também chegou a dizer, que a arte não é filha incógnita, tem sempre um pai e uma mãe, e há que respeitá-los e não os esquecer. E ele, o conservador Picasso, apesar de toda a efervescência juvenil mesmo já depois de velho, nunca deixou de respeitar e lembrar, servindo-se do seu olhar moderno para continuarmos sempre a olhar para eles.