Eis o considerado primeiro filósofo existencialista, para quem a existência é uma terrível encruzilhada de possibilidades. Terrível, pela liberdade de tanto podermos ir em frente, virar à direita ou à esquerda, ou mesmo voltar para atrás. Escolher é terrível, mais ainda por se assumir a responsabilidade da escolha. Felizes das pedras, das plantas, dos animais, por não poderem escolher, logo, não tendo de escolher. Já ser homem, ou antes, ser indivíduo, é suportar o peso de uma consciência que é só sua, avançando com o desespero de uma alternativa diante dos olhos, com a angústia de não sabermos se o que pode ser é o que deve ser. Seguirei a vida de pastor após o curso de Teologia? Caso ou não caso com Regina? Dedicar-me-ei apenas à escrita? Escolho uma vida estética ou ética? O prazer ou o dever? Serei um D. Juan mergulhado no instante, um respeitável e laborioso homem casado mergulhado numa confortável piscina moral, ou mergulharei numa loucura religiosa como a de Abraão diante do filho? Que avenidas ou atalhos me conduzem ao bem ou ao pecado? Socorro!
Últimos dias de Dezembro, um cemitério enorme, muita gente por lá no seu repouso eterno, um frio de fazer gelar os ossos, dos vivos, claro. E eu sem querer ir embora antes de cumprimentar aquele que, para Roger Scruton, compensou o seu fracasso como filósofo com o seu brilhantismo de escritor, mas já desesperado por nunca mais dar com o caminho. Mas eis, de repente, o seu nome com a mais clara e objectiva das indicações, podendo agora ir agora de olhos fechados, ao contrário de tantas outras situações em que os devia ter bem abertos mas preferindo fechá-los. Também filósofo da ironia, jamais preveria o seu nome numa placa para salvar alguém desesperado pelo que seria mais uma escolha. Caso para dizer que em casa de carpinteiro, espeto de ferro, naquele momento, para mim, e ainda que póstuma, a sua obra mais valiosa. Servisse ela para tudo o resto na vida.