02 fevereiro, 2023

ZONA DE SILÊNCIO

Numa carta de 16 de Fevereiro de 1919 à sua irmã Vanessa, escreve Virginia Woolf ser Walter Sickert o seu pintor preferido. Consideração para ser levada a sério se atendermos às muitas referências a seu respeito, tanto em cartas como no diário. O ano passado, à saída de uma grande e excelente exposição temporária do pintor, nascido alemão mas indo para Inglaterra com 8 anos, comprei um livro de Virginia Woolf onde se encontram todas essas referências em cartas e no diário, mas que tem como verdadeiro centro um texto dedicado ao pintor. Chama-se Walter Sickert: A Conversation, cuja edição original apresenta uma bem moderna capa de Vanessa, que também é Bell porque casada com o filósofo Clive Bell, defensor da teoria formalista da arte. 

Há uma imaginária conversa com amigos em que a dada altura estão diante de um livro com reproduções de Sickert. Folheiam-no e instala-se o silêncio. Diz a escritora que, como a maior parte dos ingleses, estão mais treinados para falar do que para olhar, porém, diante daquelas imagens nada conseguem dizer, só abrir e fechar as mãos, tentando exprimir com elas o que não podem as palavras, como também Coleridge não pôde explicar o Kubla Kahn, deixando a tarefa para os críticos. Diz a autora de Mrs Dalloway e artesã do fluxo de consciência, haver «uma zona de silêncio no centro de toda a arte». Ora, é possível falar sobre um quadro, eu próprio, apesar de não ser inglês, o fiz aqui em baixo. Mas para dizer o que está à superfície e toda a gente vê, o que nele é narrável ou conceptualizável. Mas a verdadeira experiência estética, o prazer estético, o que faz dedilhar as cordas da emoção estética, é privado e intransmissível. Talvez a arte esteja mesmo para o nosso tempo como a mística para a Idade Média. E para, muito provavelmente, ficarmos a ganhar.