25 janeiro, 2023

AI QUE PRAZER

Nas palavras cruzadas de hoje do Público, pede-se uma palavrinha com três letras para um prazer associado a quem gosta de livros, resposta que se dá de olhos tão fechados como a, também com três letras, ave trepadora da Austrália ou óxido de cálcio. Mas será assim tão óbvia a associação? Uma pessoa pode, sinceramente, gostar do mar, dentro do carro estacionado numa marginal a olhar para ele enquanto ouve a TSF. Isto, enquanto outros nadam, mergulham com botijas de oxigénio, navegam, estudam Oceanografia, o pintam, ou passeiam descalças pela areia, com água pelos tornozelos, ouvindo a rebentação e cheirando a maresia. Quem não gosta de livros? Quem não gosta da ideia de ler, da ideia de estar sentado com um livro na mão, acrescida da ideia de estar alheado do mundo? A pessoa em cuja casa estive há muitos anos, e que tinha um metro e tal de lombadas de um material que imitava livros, também deveria gostar muito deles, pois caso contrário enfeitaria a prateleira com outras coisas. E, na verdade, é estimulante entrar numa livraria para comprar uma daquelas milhares de capas coloridas que entram pelos olhos dentro, é confortável ter livros, um enorme prazer saber que há na mesa de cabeceira um livro para ler sem ser um dever como nos velhos tempos de escola com o Garrett e o Herculano. A chatice, depois, é conseguir passar da página 10 ou 20, como, noutros tempos, e por falar em mar, passar o cabo da Boa Esperança. Até porque muitos outros prazeres não faltam no Restelo, ponto de partida da viagem.