22 novembro, 2022

O BARCO VEIO DE REGRESSO



Quando, em 1973, directamente de Paris como os bebés, veio parar-me às mãos o Dark Side of the Moon, não foi apenas um disco que acabara de receber. Foi o meu primeiro LP e, como diria Deng Xiaoping a respeito da Revolução Francesa, ainda não passou o tempo suficiente para poder medir a importância que teve aquele disco para mim. Não conhecia o disco, não conhecia o grupo, não conhecia aquela música. Nem alguém que o tivesse. Na minha infantil inocência era como se fosse o único a ter a chave e acesso àquele tão raro e precioso tesouro. Daí o choque quando vejo na escola um colega com um igual debaixo do braço, incrédulo por haver um outro que viesse parar à minha terra tão longe de Paris, pois na minha infantil inocência aquilo só podia vir de Paris e, perplexo, perguntando-lhe como o tinha arranjado. Não me lembro da resposta mas, isso sim, de ele ter pensado, refira-se que com toda a propriedade, que eu era parvo.  

Uns bons anos mais tarde, resolvi considerar Por Este Rio Acima o melhor disco de música portuguesa de todos os tempos. E dizia aquilo como se fizesse uma grande revelação aos Moisés deste mundo, sem a qual permaneceriam nas trevas da ignorância. Até que começo a ouvir ou a ler muita gente a dizer o mesmo, e sempre pelos anos fora, e ainda hoje, quarenta anos, a propósito do concerto/homenagem na Aula Magna. Mas, ao contrário do que me acontecera com o outro, contente por não estar sozinho e  por continuar a ver novas vozes juntarem-se à minha. Dizer que Por Este Rio Acima é o melhor disco de música portuguesa, tornou-se um inevitável truísmo, mas um truísmo justo e que me deixa feliz por saber que o autor irá um dia levá-lo pelo Aqueronte acima. Há muito que deixei de o ouvir e também não estive na Aula Magna. Mas estive no concerto do Coliseu, nos anos 80, ouvi aquele vinil até à exaustão, e é com uma mistura de nostalgia, melancolia e alegria que agora descubro, pois acabei de o ouvir, que reconheço todas as suas faixas como se nunca tivesse deixado de as ouvir. Muitos parabéns, Fausto Bordalo Dias.