Sim, basta pensar um bocadinho na diferença entre comer bifes batatas fritas todos os dias ou comê-los durante dois dias depois de uma semana a pescada cozida com brócolos. Nas férias, o que o Tempo nos dá com uma mão, rouba-nos com a outra. É verdade que corta os grilhões do sinistro calendário semanal e atira pela janela o despertador que esmurra diariamente os nossos ouvidos, livrando-nos da circularidade do tempo que põe a nossa cabeça a andar à roda entre a melancolia do final de domingo e a neura de segunda de manhã. Mas não há bela sem senão e o senão tem aqui algum peso: um dia de férias é apenas um dia depois de outro dia de férias e um dia antes de outro dia de férias. Perfeitos se vistos em bloco mas caídos na irrelevância pela monótona sucessão dos dias iguais, assim um bocadinho como o vestuário dos betos nos congressos do CDS ou dos trinetos de Lenine na Festa do Avante. Como diria S. Paulo, nas férias não há segunda nem sábado, quarta ou domingo, feriado ou dia útil pois todos nós estamos em Agosto. Bebem-se assim os dias como um café americano: um balde de um raquítico e aguado café que se vai bebendo através de goles sempre iguais e até distraidamente. Como diria, desta vez o sempre divertido Cioran: mascar tempo.
Se o tempo das férias é vivido sem interrupções, já o tempo de trabalho é todo o ano interrompido por dias de férias: os fins-de-semana e feriados. Pode soar ofensivo comparar esse bodo dado ao trabalhador, que são as férias, com umas borrifadelas de ócio entre duas semanas de trabalho. Mas isso é um erro de percepção. Chegar a sexta-feira é como desembarcar numa paradisíaca ilha de ócio rodeada de trabalho por todos os lados, para nos deitarmos à sombra de uma bananeira. Nada que ver com estar no 17ª dia de férias, que é antes do 18º e depois do 16º. Daí um dia de ócio no fim-de-semana ser como uma curta mas concentrada italiana. Ora, se um ano tem quarenta e oito semanas de trabalho e um fim-de-semana tem dois dias, isto vai dar noventa e seis dias em que não se trabalha, sem contar com os feriados, ou seja, mais do que o triplo dos dias de férias. Podemos não mandar no Tempo mas como pequenos Prometeus ir a um dos seus bolsos recuperar o prazer do tempo roubado pelas férias. Melancolia de domingo? Neura de segunda-feira? Navegue-se durante a semana como no mar Egeu e veremos sempre a aparecer por ali perto uma ilha à nossa disposição.