«Chegou novamente o tempo dos emigrantes. Eles vinham em grupos, alguns sozinhos. Eram trazidos por caudais de água como alguns peixes em certas épocas do ano. Os emigrantes vão na enxurrada para o Ocidente, levados pelo destino. [...] Conhecem países estrangeiros e outras vidas e, da mesma maneira que eu, já despiram muita vida.»
Seria difícil aqui não pensar na queirosiana «nudez crua da verdade» sob «o mando diáfano da fantasia». Apresentar a vida como coisa que se despe remete, nalguns casos, para um strip-tease existencial, quando é a própria vida que se vai despindo diante de uns desprevenidos olhos que nada podem fazer a não ser assistir ao espectáculo. Já noutros, será a própria pessoa, com as suas inquietas e habilidosas mãos, que vai desvelando a nudez, tirando peça de roupa aqui, peça de roupa ali. Claro que as surpresas podem ser mais, ou menos, agradáveis e, muitas vezes, o que se esconde sob a roupa não é coisa bonita de se ver, como, de resto, mostra a história e as vidas de tanta gente. Tanta gente que nasce, vive e morre, e o que lhes ficou da vida foi uma nudez escondida por grossos e opacos mantos de uma fantasia que, não raras vezes, deixa também imenso a desejar.
