28 junho, 2024

JE NE SAIS QUOI

Na minha escola há o hábito de ler um texto no início de cada conselho de turma, quase sempre um poema. Esta semana, poucos dias depois de uma ex-aluna me ter dito que estava aware de uma determinada situação, uma colega escolheu duas passagens da Antígona, o que muito me alegrou, por não ter de ouvir mais um poema e por ser um dos meus textos preferidos, mas informando que iria lê-las em Inglês. A professora, que não é de Inglês, é uma jovem, tão jovem que, no dia em que chegou à escola, ao entrar num pavilhão para dar aula, a funcionária começou a ralhar com ela por os alunos só poderem entrar depois dos professores. Começa a ser cada vez mais habitual ver jovens, os poucos que lêem, lendo em Inglês, ou a misturarem palavras inglesas com portuguesas. Apesar do sinal de cosmopolitismo, provando que já não somos os bárbaros lusitanos de Tácito, foi maior o meu prazer ao receber de um jovem (também anglófilo) uma caixinha de chocolates. Pelos chocolates, claro, mas por estar escrito na caixa a palavra "Merci", que, por ser francesa, aparenta cada vez mais o raro estatuto e arcaico sabor de uma palavra grega ou latina. Gosto muito de Inglaterra, ouvi muita, e continuo a ouvir, música anglo-saxónica, ainda hoje, apesar de não ter lareira, não me sai da cabeça "Home, home again/I like to be here when I can/And when I come home, cold and tired/it's good to warm my bones beside the fire", gosto de scones com manteiga no Inverno, do mundo de Beatrix Potter, de ouvir as vozes do Jeremy Irons ou do John Gielgud a falar aquela língua, das capas dos Genesis, e tenho um gato cujo nome pedi emprestado a Virginia Woolf. Mas foi o Francês a minha primeira língua, foi pela música francesa e o cinema francês que comecei, fiz o meu curso a ler Francês, aprendi primeiro a andar sozinho em Paris do que em Lisboa, cidade onde fui muito feliz na infância e adolescência, e tive como primeira paixão uma francesa, mais velha do que eu no alto dos seus 12 anos. Mesmo não sendo verdade que não há amor como o primeiro, o mesmo não se pode dizer de um país e ainda hoje não consigo subir ou descer os Campos Elíseos sem ser alegremente assaltado pelo Joe Dassin, tão alegre como na primeira vez em que olhava para todo o lado na esperança de que por ali passasse a Françoise Hardy.