20 dezembro, 2023

GOLCONDE

Para aí há uns três ou quatro anos, comecei a ter alguns alunos a agradecer-me o enunciado do teste que lhes entregava ao passar pelas respectivas carteiras, um sinal de boa educação que me deixava muito bem impressionado. Tenho agora turmas nas quais à medida que vou distribuindo os enunciados, vou ouvindo "obrigado, obrigado, obrigada, obrigada, obrigada, obrigada, obrigado, obrigada, obrigado, obrigado, obrigado, obrigada", o que mais parece uma versão oral do texto escrito por Jack Torrance na sua máquina de escrever, chegando com isso a sentir saudade do tempo em que nenhum aluno, ou apenas alguns, agradecia. Admito, entretanto, que tal saudade possa não ser inocente, podendo resultar de uma certa má consciência por não me sentir obrigado a responder "não tem de quê, não tem de quê, não tem de quê, não tem de quê, não tem de quê, não tem de quê, não tem de quê, não tem de quê, não tem de quê, não tem de quê", sendo com isso obrigado a reconhecer a minha má educação diante de alunos tão bem educados.