Só um bocado depois de dizer "O meu cérebro sabe coisas que eu não sei" tive a consciência de ter matado o pai, cuja obra maior foi publicada em 1899, mas apresentando 1900 como data, início de uma nova era. Mas isso foi há mais de cem anos e eu digo que o meu cérebro sabe coisas que eu não sei, em vez de dizer que o Id, essa coisa a que chamamos inconsciente, sabe coisas que eu não sei. Eis-me agora tão moderno neste meu ano como Freud o foi no seu. E em vez de um sótão repleto de vestígios arqueológicos da mitologia pessoal de cada um e que, como em Xanadu, repousam lá perdidos e ignorados, passei a ter umas circunvoluções que podem ser axialmente tomografadas por um computador, as quais, como as placas deste computador pelo metal envolvente, estão protegidas por uma caixa craniana, também para proteger as coisas que elas sabem e eu não sei. Agora que a I.A. está na ordem do dia, talvez nos venhamos mesmo a tornar mais filhos de Mary do que de Percy Shelley ou Byron, quando, em 1816, perto de Genebra, cada um escreveu a sua história durante aqueles dias de mau tempo, ainda bem longe de 1900 e da modernidade que iria chegar com ele.