21 agosto, 2023

SÍLABAS

Desde que o li pela primeira vez, já lá vão muitos anos, que me sinto interpelado pelo §44 de O Crepúsculo dos Ídolos: "A fórmula da minha felicidade: um sim, um não, uma linha recta, uma finalidade...". Deu-me, entretanto, para ir ver como se diz "sim" e "não" em muitas e diversificadas línguas, para concluir que em nenhuma delas tem mais de duas sílabas e quase sempre só uma. Acto contínuo, fui averiguar qual a maior palavra da língua portuguesa. Guardara na memória dos tempos de liceu "anticonstitucionalissimamente" mas (com a Internet a sapiência atinge outros horizontes) afinal é "pneumoultramicroscopicossilicovulcanoconiotico". Se para dizer "sim" ou "não" recorrêssemos a uma palavra com uma grande quantidade de sílabas, o mais certo seria cairmos numa espécie de acrasia. Percebe-se assim como as línguas quiseram ajudar-nos na tomada de decisões, sendo usadas em consonância com os nossos marcadores somáticos. O problema é a exorbitância silábica do pensamento tantas vezes esmagar a pequena e singela sílaba que deseja libertar-se desde a ponta da língua. Talvez isso explique porque Nietzsche não foi propriamente uma pessoa feliz, e nem sequer estou a pensar na doença que haveria de o deitar abaixo de vez.