30 maio, 2023

BRABEL

Torres Novas, 2023

Diz frei Bento Domingues, no Público de sábado, que a decisão divina de criar várias línguas durante a construção da torre de Babel serviu para promover a diversidade humana, impedindo assim uma imperialista tendência para a uniformidade promovida pelos mais fortes. Eis uma perspectiva que subverte a clássica ideia de associar esta história a um castigo, e que faz ver a pluralidade linguística como um anátema para a humanidade. Por outro lado, opõe este mito de um Deus preocupado em promover-nos uma vida feliz, ao de Prometeu, em que deuses e homem surgem como rivais, obrigando este a roubar o fogo cuja falta o impede de alcançar essa vida feliz.

Fazendo de um simples Bra, um épico braço de ferro entre homem e deuses, que chega mesmo ao ponto de transformar o numeral árabe em anglo-saxónica proposição, esta loja assume todo um desafio antropológico, conseguindo, de uma assentada, superar a oposição entre os dois mitos. Ao promover o regresso a uma uniformidade pré-babélica, coloca-se expressamente do lado de uma poderosa língua, rejeitando, de modo arrogante e altivo, a vontade divina, o que também faz com que, como no mito grego, se tornem rivais. Não obstante a sua irrelevância, salva-se a partícula copulativa. Quem sabe se um vestígio de culpa, abrindo com isso a possibilidade de um último fôlego de sobrevivência de uma língua para lá do poder avassalador da lingerie à qual se encontra agrilhoada.